Publicada no dia 27 de junho de 2014, a Lei nº.: 13.010/14, ou simplesmente Lei da Palmada ou Lei do Menino Bernardo, tem o escopo de proibir os pais ou responsáveis de excederem ou abusarem dos meios de correção ou disciplina em crianças ou adolescentes.
Porém, interessantemente, há um antagonismo na nomenclatura da Lei com o que, de fato, a mesma dispõe, pois a ‘Lei da Palmada’ não traz qualquer vedação do uso dos meios mais comuns de correção, qual seja, o tapa (própria palmada), chinelada, etc. A proteção recai sobre tratamentos cruéis, como ameaças graves, humilhação e, sobretudo, o castigo físico capaz de causar lesões e sofrimento.
Sem sombra de dúvida, mesmo com o passar do tempo (ainda que recente) o assunto desperta inúmeros comentários. Há quem se posicione em vertentes conservadoras, outros pelo lado mais liberal e por aí vai. Na verdade, ainda dentro do plano jurídico, a meu ver, o legislador tem pecado demasiadamente em suas ‘aventuras’ legais hodiernas.
A impressão que tenho, é que hoje estamos cada vez mais nos aproximando de um direito penal “simbólico” e extremamente punitivista, o qual além de suprimir toda sua base principiológica e estrutural, “pisoteia” (expressão forte, porém, real) os institutos da Criminologia e Política Criminal para atender os clamores ‘acientíficos’ da sociedade. Em termos simples, ocorre assim: Deu na mídia e causou instabilidade social, puna! Se não tiver lei para punir, crie.
No caso da Lei da Palmada, o legislador “choveu no molhado”. Explico: Inicialmente, a vedação à violência física e à crueldade contra menores nas formas de correção, disciplina e educação encontra-se em nosso ordenamento jurídico há tempos. Escalonando, basta abrir a Constituição Federal no art. 227, caput e § 4º. Na esteira, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) reprime tais atitudes draconianas em diversos pontos (art. 5º, 18, dentre outros). E mais. Na verdade, voltando-se para a seara criminal, já existe crime e sanção para quem extrapola os limites do normal na criação e educação de crianças e adolescentes (art. 136, CP). Assim, a redação do artigo retro aduz, verbis:
Maus-tratos
Art. 136. Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina:
Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano, ou multa.
Daí se falar em retrocesso legal. Tudo já está positivado, incluindo as medidas aplicáveis aos pais ou responsáveis (art. 129, do ECA). Como a alteração legal não prevê sanção para os pais e/ou responsáveis pelo tratamento atroz, comungo, com a devida vênia, o posicionamento de Luiz Flávio Gomes, ao salientar que a lei penal que não prevê pena não surte os efeitos preventivos que deveria surtir, muito menos surtirão as que não preveem punição (como no caso). O que poderá ser preocupante é o abarrotamento de denúncias, grande parte das vezes infundadas, que receberão os órgãos competentes para tomar qualquer tipo de providência a respeito (A Lei expõe como órgão inicial o Conselho Tutelar).
Embora ainda seja muito cedo (mesmo se passando quase 02 – dois – anos de sua publicação) para levantar uma gama de críticas sobre a Lei nº.: 13.010/14, elas existem. Creio na importância da divulgação do real teor da Lei (palestras, entrevistas em meios de telecomunicação com profissionais da área), pois como dito anteriormente, o nomen legis pode transmitir à sociedade uma vedação do que não é efetivamente proibido, trazendo-se, assim, um posicionamento negativo-conservador do que realmente prega o teor legal.